quinta-feira, 26 de agosto de 2010
segunda-feira, 23 de agosto de 2010
MULHERES DE AR
"Procura-se Bete"
vou mandar fazer uma placa...
Não que espere que Bete apareça
Suas pernas torneadas
domaram o asfalto,
tão seguras de si,
que Bete era feita somente de pernas.
"Procura-se Ângela"
e seus olhos de Lua sempre cheia
Repletos de apreensão difusa,
imploravam por conforto e segurança,
como se o susto antecipasse o fantasma -
que bom que na hora eu passei...
"Procura-se Estela",
naquele vestido aquarela
O mesmo que envolveu o seu corpo
e seus contornos de cor,
deixava pra trás o tom cinza invariável
de passado sem saudade.
"Procura-se ela",
ainda que não tenha nome
nem forma,
mesmo assim tão presente
quanto qualquer mulher
da minha vida inventada.
DANILO ZAMAI - 23/08/2010
sexta-feira, 20 de agosto de 2010
NOVOS VIZINHOS
- Vou fechar a janela, gato, tá um puta dum frio. Vai ficar aí ou vai entrar?
- Pode fechar, vou ficar aqui mais um tempinho.
- O que você tanto olha aí, afinal, posso saber?
- Você não viu que mudou gente nova no apartamento da frente, no segundo andar?
- Eu vi um caminhão de mudanças um dia desses, mas nem prestei atenção em quem poderia ser. Eles estão lá embaixo...?
- Hei, hei, hei, o que você tá fazendo! Presta atenção, pô! Não aparece com a cabeçona na janela, senão você vai dar muito na cara.
- Então me fala: quem é que você está vendo aí?
- O pessoal que se mudou, os novos vizinhos, eles trouxeram uma gata, e ela está se espreguiçando no parapeito neste exato momento. Uhmm, que belo exemplar da espécie...
- Vai lá, garanhão, joga um charme pra ela.
- Já vi que de fêmea você não entende muita coisa... Não posso me comportar feito um predador, vai assustar a gatinha. Além do mais, preciso parecer indiferente, até mesmo desinteressado por causa da Tita, a gata do terceiro (andar); preciso deixar no ar a minha preferência por ela, mesmo com a chegada da nova vizinha. Assim eu faço uma dupla jogada: a Tita não me vê como um safado, um cara de pau, e ainda deixo a impressão para a recém-chegada de que não me jogo atrás de qualquer rabo de gata (o que é uma baita mentira). Os gatos da redondeza vão aparecer igual urubu, quando sentirem o cheiro de carne nova no pedaço. Eu vou ficar na minha, aparentando normalidade. Não vai demorar muito a vizinha nova percebe o flerte que rola entre mim e a Tita, daí é esperar pela reação dela, ver se ela começa a prestar mais atenção em mim...
- É bem isso mesmo... Mulher é igual emprego: só aparece quando você já tem uma.
- Por isso você não tem nem um nem outro, e pelo visto vai continuar assim por um bom tempo...
- Vai me zuando, gato, acabo com o seu esquema romântico agora, se você quiser.
- Hei, cara, tô só brincando, pega leve.
- Aposto que você ia ficar puto se chegasse da rua qualquer dia e percebesse que tem mais alguém dormindo na cama, sem espaço pra você deitar. Você sabe que eu durmo até mais tarde e que a minha cama é a única que fica desarrumada o dia todo. Queria ver a sua cara se houvesse alguma mulher pra me obrigar a organizar este quarto... Adeus edredom pra se enfiar e adeus escurinho pra você não dormir com a cara no Sol. Isso se eu não conhecesse alguém que não gostasse de gatos...
- Senti o cheiro da discórdia no ar...
- Porra, me esqueci do pão na frigideira!
quarta-feira, 18 de agosto de 2010
domingo, 15 de agosto de 2010
sexta-feira, 13 de agosto de 2010
PÁGINAS AMARELADAS
Recuso me² enquadrar
e nem me ouse chamar
de "dicionário ambulante"
Apenas trato, de modo especial,
as palavras, todas elas
- o que significa, por vezes,
despertá-las do pesado sono
sob a cova enciclopédica.
Mas não me chame "enciclopédia ambulante"
Longe de mim!
Para tanto, manejo, os deixo tontos,
vocábulos ordinários
postos em campo estrangeiro,
em casa dos outros
e arco o preço
que isto implica a meus ouvidos.
Só não posso passar reto
- e aqui revelo o meu fraco -
duma palavra formosa,deitada
sobre o papel amarelo
(um verdadeiro elefante branco),
que encheria sozinha o verso em cheio,
mas não caberia numa única conversa
E passariam os anos,
e correriam os dias
sem que os sentidos fossem tocados
pela melodia de tal palavra...
a menos que um esteta, em pleno dispudor,
revelasse seu escrito
como hieróglifo perdido
nas areias amareladas do Cairo.
DANILO ZAMAI - 13/08/2010
Recuso me² enquadrar
e nem me ouse chamar
de "dicionário ambulante"
Apenas trato, de modo especial,
as palavras, todas elas
- o que significa, por vezes,
despertá-las do pesado sono
sob a cova enciclopédica.
Mas não me chame "enciclopédia ambulante"
Longe de mim!
Para tanto, manejo, os deixo tontos,
vocábulos ordinários
postos em campo estrangeiro,
em casa dos outros
e arco o preço
que isto implica a meus ouvidos.
Só não posso passar reto
- e aqui revelo o meu fraco -
duma palavra formosa,deitada
sobre o papel amarelo
(um verdadeiro elefante branco),
que encheria sozinha o verso em cheio,
mas não caberia numa única conversa
E passariam os anos,
e correriam os dias
sem que os sentidos fossem tocados
pela melodia de tal palavra...
a menos que um esteta, em pleno dispudor,
revelasse seu escrito
como hieróglifo perdido
nas areias amareladas do Cairo.
DANILO ZAMAI - 13/08/2010
quarta-feira, 11 de agosto de 2010
quinta-feira, 5 de agosto de 2010
SEM CERTEZA
Cabe à certeza ter
uma porta bem fechada por chave
trancada por fora
pertences pra dentro
Caso ninguém não perceba
há um aviso pendurado na porta
guardados no armário
sapatos de passos possíveis
O mundo gira as pás
que geram o vento das mudanças
Com certeza
é nadar contra a corrente giratória
é se agarrar em migratória miragem
é lançar âncora no cansaço
Cheio de incertezas
é o fundo musical que passeia
sobre as cabeças dos homens diários
é o medo de que os prédios erguidos
na solidez movediça do mercado
flutuante desabem.
DANILO ZAMAI - 05/08/2010
Cabe à certeza ter
uma porta bem fechada por chave
trancada por fora
pertences pra dentro
Caso ninguém não perceba
há um aviso pendurado na porta
guardados no armário
sapatos de passos possíveis
O mundo gira as pás
que geram o vento das mudanças
Com certeza
é nadar contra a corrente giratória
é se agarrar em migratória miragem
é lançar âncora no cansaço
Cheio de incertezas
é o fundo musical que passeia
sobre as cabeças dos homens diários
é o medo de que os prédios erguidos
na solidez movediça do mercado
flutuante desabem.
DANILO ZAMAI - 05/08/2010
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